quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

O cenário para saúde


José Renato Condursi Paranhos



O momento atual do mercado de saúde no Brasil merece análise especial. Por muitos anos o sistema de saúde privado se concentrou na geração de riqueza, com base na tecnologia e na complexidade do atendimento. A modernidade dos equipamentos de diagnóstico e tratamento e a solicitação de um número cada vez maior de exames complementares foram difundidos como padrão de qualidade de atendimento. Durante essa fase houve pouca preocupação com o cliente, com suas necessidades, e se o sistema estaria, de fato, tornando melhor o atendimento. Essas ações do passado culminaram com a elevação preocupante dos custos da assistência a saúde e , o que é pior, com a insatisfação dos clientes, que buscam cada vez mais um atendimento humanizado e de qualidade. Se, por um lado, o crescimento da participação da iniciativa privada no setor se deu ocupando uma lacuna deixada pelo sistema público de saúde, por outro, ações governamentais de origem tanto legislativa quanto executiva passaram a exercer forte regulamentação do setor.

Os profissionais estão experimentando profundas mudanças, tanto no seu âmbito da atuação, quanto no seu relacionamento com hospitais, públicos e privados, operadoras de saúde, laboratórios e outras organizações. Em relação aos exercícios rotineiros de atividades, boa parte está trabalhando cada vez mais para manter um nível satisfatório de renda, muitas vezes com vários empregos. Em alguns casos, as condições de trabalho são questionáveis, devido à precária estrutura do setor, principalmente a pública. Os processos legais contra profissionais tornaram-se freqüentes; a liberdade de prescrição e solicitação de exames complementares está cerceada, por imposição de algumas operadoras de saúde.

Os hospitais também estão passando por um momento crítico, de dificuldades gerenciais e financeiras. Tal fato exige importantes e imediatas reflexões, análises e decisões para o setor. Os custos hospitalares estão cada vez mais elevados, seja poe pressão dos custos fixos, seja pela complexidade natural da assistência médica. Por outro lado, o comprador do serviço, principalmente operadoras de saúde, pressiona por preços cada vez mais baixos, que, na maioria das vezes, são insuficientes para cobrir os custos, como conseqüência temos hospitais endividados, dependentes de empréstimos a juros elevados, inoperantes, chegando ao ponto de comprometer sua sustentabilidade. Estudos recentes tem demonstrado que a margem de lucro líquido dos hospitais com seu negócio principal vem caindo. Por outro lado, os itens materiais e medicamentos têm tido crescente participação no faturamento. A hotelaria, os exames e as taxas de uso do centro cirúrgico estão deixando de ser o negócio principal, provocando uma distorção: os hospitais estão deixando de ser prestadores de serviço e passando a ser fornecedores de materiais e de medicamento. Outro ponto para análise refere-se ao conflito existente entre os hospitais e as operadoras de saúde, pautado na desconfiança, na auditoria fiscalizadora e punitiva, e não na construção conjunta de eficientes modelos de gestão.

Assim, podemos resumir o cenário atual de hospitais da seguinte forma: dificuldades de gestão estratégica e financeira; custos crescentes, com forte pressão por redução de preços; desenvolvimento tecnológico e científico diminuindo as internações hospitalares; dependência do Sistema Único de Saúde (SUS).

O setor de operadoras de saúde também merece algumas considerações. Como os hospitais, esse segmento passa por dificuldades de gestão administrativa e financeira, afetando principalmente as pequenas empresas. Por outro lado, o processo de consolidação, por meio de fusões e aquisições entre as grandes empresas, acrescido de investimentos em capacitação técnico-profissional e de maior captação de recursos financeiros por meio de investimentos diretos ou de abertura de capital na bolsa de valores, tem resultado em ganhos gerenciais expressivos. Consequentemente. Empresas fortes e bem estruturadas vêm mudando a fisionomia do setor, principalmente por meio de estratégia da verticalização. Assim, algumas empresas têm adquirido hospitais, clínicas de propedêutica, laboratório de análises clínicas, e conseguido, por meio de uma gestão empresarial eficiente, diminuir custos. Tais ações vêm permitindo a recuperação financeira e a ampliação da força e do poder de negociação desse setor.

O cenário atual para operadoras de saúde pode ser definido como: custos crescentes, com forte pressão por redução de preços, legislação rigorosa que obriga a ampla cobertura de serviços , crescimento do mercado diretamente dependente do crescimento da economia do país, forte concorrência, altos índices de reclamações (PROCON) e na (ANS).

O  que podemos esperar, em termos de futuro ,em relação ao cenário no Brasil e no mundo?Quais serão as mudanças e como podemos nos antecipar a elas?Estamos preparados para nos adaptar às novas características desse mercado?

Um comentário:

  1. A aceitação da impermanência dos cenários no segmento saúde certamente é caminho necessário de ser percebido, aceito e trilhado, enquanto estratégia para reversão da crise vivenciada pela saúde - indiferentemente pública e privada. No segmento prevalece uma cultura fechada em dogmas e paradigmas pretéritos, pautando suas práticas e decisões em "verdades" construídas a partir de parâmetros equivocados, gerando entropia às organizações. As mudanças havidas, não raro, atacam consequências e não causas do problema, desprezando-se as intangibilidades presentes nos processos e relações estabelecidas. É preciso ampliar horizontes, trazendo para o segmento novas perspectivas de intervenção, valorizando saberes e repensando poderes que, ao longo do tempo, tem sido responsáveis pela contaminação dos processos de construção decisória na saúde, impedindo melhora no desempenho e desenvolvimento de suas organizações.

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